Neste Blog rendemos a nossa homenagem aos Gestores e Agentes Policiais que, apesar das dificuldades internas, das leis brandas, do enfraquecimento da autoridade, dos salários baixos, do fracionamento do ciclo policial e das mazelas do Judiciário que discriminam e alijam as forças policiais do Sistema de Justiça Criminal impedindo a continuidade e a eficácia dos esforços contra o crime, dedicam suas vidas na proteção do cidadão, na preservação da ordem pública e na defesa do povo, das Instituições e do Estado, em prol da almejada PAZ SOCIAL no Brasil.

domingo, 27 de abril de 2014

A DELEGADA



ZERO HORA 27 de abril de 2014 | N° 17776


ARTIGOS


 Moisés Mendes*




Já conversei com mais de uma dúzia de pessoas que esclareceram o assassinato do menino Bernardo. Em Porto Alegre, a 470 quilômetros de Três Passos, tem gente com mais detalhes do caso do que a delegada Caroline Virgínia Bamberg Machado.

Mas a bronca não está com os detetives amadores que imaginam o desvendamento do crime, está com a delegada. Nós, que analisamos tudo de longe, tiramos conclusões, indiciamos, definimos penas – nós temos certezas porque não passamos nem perto das encruzilhadas à espera de Caroline. Nós deduzimos, deitamos e dormimos. A delegada está com a cara de quem não dorme há um mês.

Casos como esse, com fartura de figuras do mal, exigem o contraponto forte de uma figura da lei e do bem. Episódios assim não podem nunca ter, em oposição a tanta crueldade, uma figura opaca e sem vitalidade.

A delegada está incumbida da missão de nos dar a chance da reparação. Se todos falhamos e não evitamos a morte da criança, a remissão vai começar pela determinação desta policial, pela sua voz forte, pelo sotaque, pelo jeito como se refere a Bernardo como “o guri”, pela certeza de que pegará os culpados.

O repórter Itamar Melo publicou na ZH, há dois anos, uma série fantástica sobre os medos da infância. Descreveu um temor em cada reportagem. Eram sete medos: de monstros, de ficar longe dos pais, de escuro, de repetir de ano, de violência, de rejeição social e da morte.

Lembrei das reportagens quando contaram agora que um dia Bernardo foi sozinho ao foro de Três Passos e lá relatou seus medos. O único medo que talvez pouco o incomodasse era o de repetir de ano, insignificante demais ao lado de todos os outros juntos.

Na quinta-feira, encontrei Itamar numa esquina movimentada aqui da Redação e conversamos a respeito do caso e da delegada. O repórter me disse, com a voz sempre na modulação de quem murmura algo que só o interlocutor deve ouvir: ela é gótica.

É um elogio. A delegada Caroline ficaria bem no papel de policial do filme Blade Runner. Mas o que importa é que ela passa firmeza. Com tantas instituições e autoridades moles, o Brasil precisa de gente com o perfil da delegada.

Quem não gostaria que autoridades com a pegada de Caroline investigassem e apontassem outros culpados? Por que o meu, o seu, o nosso Fundo de Garantia é saqueado com uma remuneração de 3% (TRÊS) ao ano e não acontece nada? Por que as operadoras de celular fazem o que querem com os usuários e os juros dos bancos chegam a 200% como se isso fosse normal?

Por que o mensalão tucano está quase engavetado, e Collor escapou de novo (22 anos depois!)? Por que a sua conexão de internet não é a que você comprou, por que pagamos a luz mais cara do mundo? Por que o processo da máfia do Detran está empacado? Por que ninguém faz nada de efetivo que interrompa as crueldades estatais e privadas?

Ouvindo-se a delegada, tem-se a impressão de que o Estado, este ente tão esfolado, às vezes se manifesta com vigor em aparições boas em meio a uma desgraça. Uma delegada é hoje a expressão do Estado que funciona.

Seria bom se existissem mais Carolines com aquele sotaque de convicção e autenticidade. Representantes da lei, e não justiceiras, que nos protegessem das maracutaias miúdas e graúdas, desses delitos incorporados ao nosso cotidiano como se dele fizessem parte para nos esfolar impiedosamente.

**

Dizem que a delegada cometeu falhas. Apontam defeitos no cumprimento de formalismos do inquérito. É a hora dos truques a serviço dos acusados. Nada que abale a confiança que a delegada nos passa. Como também me passa confiança o chefe dela, o delegado Guilherme Wondracek, porque conheço sua história desde a adolescência.

Guilherme usava óculos de lentes grossas e tinha todo o jeito de que poderia um dia lecionar sobre a Idade Média, jogar xadrez ou ser cientista de laboratório. Decidiu pôr a inteligência a serviço da polícia e chegou ao topo.

Wondracek e Caroline nos confortam. Que se protejam, pois já foram acionadas em volta deles as manobras escapistas para transformar o desfecho desse crime em mais uma vergonha, como aconteceu com o Caso Daudt. Leve as investigações até o fim, delegada Caroline. Faça isso por todos nós, mas faça mesmo pela memória do guri.

*JORNALISTA





COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Merecido os elogios e estes se estendem a todos os sacrificados policiais estaduais que lutam contra muitas dificuldades, fracionamento do ciclo, enfraquecimento pelas leis permissivas, retrabalho contra o crime e segregação da justiça. No caso Bernardo, a polícia investigativa revela esforço, inteligência e comprometimento. Resta esperar a continuidade destes esforços nos demais instrumentos de justiça criminal. PARABÉNS DELEGADA!!!

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